Em Campo Grande, estatísticas extraídas dos últimos 20 meses referentes às audiências de custódia, levantadas pela Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, por meio do Núcleo Institucional Criminal (Nucrim), apontam que 71,5% das pessoas que foram presas e que passaram por audiências de custódia eram negras.
O recorte da pesquisa foi feito em alusão ao Dia da Consciência Negra, celebrado neste domingo (20).
Detalhadamente, os dados abrangem o período de março de 2021 (data do início dos levantamentos estatísticos) a outubro de 2022.
O coordenador do Nucrim, defensor público Gustavo Henrique Pinheiro, destaca que a questão racial é um importante variável a ser considerado quando se trata do sistema prisional brasileiro.
“Alguns números chamaram a atenção e merecem reflexão, valendo registrar que as audiências de custódia fornecem um relevante panorama da porta de entrada no sistema prisional. Em outras palavras, é um importante “termômetro” de encarceramento”, pontua.
Números
Segundo informações levantadas pela Defensoria, 4.878 pessoas passaram pelo ambiente forense da audiência de custódia, em Campo Grande, no período já citado.
Destas pessoas, 3.486 se autodeclararam negras (634 se declararam pretas e 2.852 se declaram pardas), o que representa 71,5% das pessoas que foram presas nesses últimos 20 meses.
O Estado de Mato Grosso do Sul, segundo estimativas do IBGE, conta com população de cerca de 2.839.188 habitantes. A
Já a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2020/2021 mostrou que 43,0% destes indivíduos se auto declararam como brancos, 49,6% como pardos, e 6,1% como pretos, totalizando 55,7% da população de cor/raça negra (pretos e pardos).
Diante disso, nota-se, portanto, uma sensível discrepância entre a proporção de negros dentro da população de presos (71,5%) e a proporção de negros na população em geral (55,7%).
Determinante social
O defensor Gustavo Pinheiro reitera a afirmação feita pela especialista e diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), Samira Bueno, de que a estatística de elevada proporção de pessoas negras encarceradas vem atrelada a uma determinante social importante.
O principal problema é que há maior vulnerabilidade das pessoas negras à violência no Brasil.
O estudo divulgado pelo Nucrim destaca que, dada a complexidade e multidisciplinaridade do tema, não é possível se chegar a uma conclusão definitiva sobre a causa – ou as causas – da maior taxa de encarceramento de negros.
Todavia, algumas hipóteses podem ser lançadas, sem prejuízo de outras que porventura possam existir.
Uma das hipóteses remonta ao tratamento histórico dado pelo aparato estatal; outra hipótese possível é que o maior encarceramento da população negra se deva não em razão de sua cor ou raça propriamente dita, mas, sim, em razão de sua condição socioeconômica.
Em síntese, prende-se mais pessoas pobres, sendo certo que muitos dos pobres são negros.
“Esperamos que a data de 20 de novembro, que marca o dia da consciência negra, em um futuro próximo, mais do que um dia de luta, seja também lembrada como uma data de celebração”, disse o coordenador do Nucrim.
FONTE: CORREIO DO ESTADO