A Frente de Defesa dos Consumidores de Energia Elétrica vai apresentar ao governo eleito uma proposta para transferir os subsídios bilionários do setor, hoje concentrados na conta de luz, para o caixa do Tesouro Nacional.
O custo desses benefícios é crescente e vem onerando especialmente o bolso dos consumidores mais pobres, para quem a tarifa de energia pesa mais.
Uma discussão inicial já foi feita com o grupo de transição de Minas e Energia. Agora, as entidades estão redigindo os detalhes que vão constar de um documento a ser entregue para futuro ministro da área.
Atualmente, esses subsídios estão agrupados na CDE (Conta de Desenvolvimento Energético). Em 2017, por exemplo, ela custava cerca de R$ 17 bilhões, um valor já elevado. Neste ano, chegou a R$ 32 bilhões. Isso equivale, na média, a 13% da tarifa.
A entidade entende que a maior parte dos recursos da CDE são recolhidos para financiar políticas públicas, assim, esse custo deve ser discutido nos órgãos de governo e distribuídos no Orçamento da União, e não agrupados no boleto dos consumidores de energia, que nem sabem pelo que estão pagando.
Na tentativa de dar clareza para esse custo, que fica embutido na tarifa, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) lançou no final de novembro o Subsidiômetro, ferramenta digital que atualiza quanto subsídio vai sendo pago na conta de luz ao longo do ano.
Segundo o presidente da frente, Luiz Eduardo Barata, a entidade entende que essa transferência para o Tesouro poderia ocorrer de forma gradual, ao longo de cinco anos, com um repasse de 20% dos subsídios ao ano.
“Entendemos que a proposta é justa e, como ela será feita com planejamento, é perfeitamente ajustável ao Orçamento da União”, afirma Barata.
Um exemplo do sucesso do gradualismo para uma transição desse tipo, diz Barata, foi o tratamento adotado para o fim dos subsídios à irrigação e saneamento. A extinção foi negociada e realizada paulatinamente ao longo do últimos cinco anos, com todos os envolvidos já preparados para o seu fim, previsto para 2024.
Em paralelo, a frente também pretende apresentar sugestões para, no curto prazo, reduzir os subsídios e criar critérios para definir um limite para os benefícios, uma espécie de teto de gastos na área de energia.
Essa seria uma alternativa para deter a criação de novas benesses, o que vem ocorrendo especialmente por meio de lobbies que mudam as regras do setor no Congresso.
Neste momento, por exemplo, está no Senado o PL 2703/2022, que pode adicionar R$ 125 bilhões em subsídios na conta de luz.
A preocupação maior é com a CCC (Conta de Consumo de Combustíveis), que corresponde a praticamente um terço da CDE. Basicamente, ela banca os custos de geração de energia em sistemas isolados, que não foram conectados ao Sistema Interligado Nacional, como parte da Amazônia.
A entidade acredita que esse custo poderia cair com a adoção de um programa de descarbonização. Usinas fotovoltaicas poderiam ser instaladas ao lado das térmicas a combustível fóssil, para que operem de maneira intercalada.
Em Rondônia, algo do gênero já é feito de maneira informal, via geração distribuída dos próprios consumidores, conforme mostrou reportagem da Folha.
Barata lembra que a transferência dos subsídios para o Tesouro é apenas uma parte da premente revisão do modelo do setor. Ele reforça que todo o arcabouço precisa sofrer uma revisão radical para atender à nova realidade do setor.
O atual modelo foi criado em 1998 e revisado em 2004, e já não atende as demandas atuais, afirma.
Em 1998, praticamente 90% da geração era hídrica. Havia poucas térmicas a carvão e óleo combustível.
Em 2004, as térmicas tinham avançado, ocupando espaço das hidrelétricas. Na época, não havia mercado livre e as fontes renováveis eram alternativas caras e restritas.
Atualmente, a fonte hídrica caiu para a casa de 60% do total da geração, o mercado livre abriga grandes empresas e boa parte dos negócios de médio porte e já se discute como levá-lo para residências.
As fontes eólica e solar, especialmente na modalidade de geração distribuída, avançam rapidamente, com custos cada vez mais competitivos.
“Nos próximo anos, não vamos mais operar com hidrelétrica na base [como fonte que segura a oferta de energia], mas com renováveis”, afirma Barata. “São condições muito diferentes daquelas que existiam quando o modelo foi criado, e precisamos de uma revisão estrutural do arcabouço setorial.”
Fazem parte da frente Conacen (Conselho Nacional de Consumidores de Energia Elétrica); Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor); iCS (Instituto Clima e Sociedade); Instituto ClimaInfo; Instituto Pólis; Abrace (Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres); Anace (Associação Nacional dos Consumidores de Energia) e Abividro (Associação Brasileira das Indústrias de Vidro).
FONTE: CORREIO DO ESTADO