As forças de segunrança conseguiram controlar por volta das 20 horas desta quarta-feira a rebelião que teve início no fim da manhã de ontem no presídio de Cassilândia, cidade que fica a cerca de 410 quilômetros de Campo Grande, na divisa com Goiás. Conforme a Agepen (Agencia Estadual de Administração do sistema Penitenciário), 107 internos foram transferidos para outras cidades.
O motim começou horas depois de a Polícia Federal desencadear uma operação para desmantelar um suposto plano para resgatar o chefe da facção Primeiro Comando da Capital (PCC), Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola. Os investigadores acreditam que o PCC gastou aproximadamente R$ 5 milhões apenas na articulação para tentar libertar Marcola, que está preso desde julho de 1999, mas foi transferido para o sitema penitenciário federal quando o senador Sérgio Moro era ministro da Justiça.
Esta facção controla praticamente todos os presídios em Mato Grosso do Sul, mas apesar disso, uma nota da Agepen diz que “a situação foi um fato isolado ao presídio de Cassilândia, não tendo ocorrido reflexos em outros estabelecimentos penais do Estado”.
A nota informa ainda que “Policiais Penais do Comando de Operações Penitenciária (COPE) realizaram a intervenção no presídio e retomaram a ordem no local sem intercorrências. Após a retomada da ordem da unidade foi realizada a conferência geral dos internos.
De acordo com a Agepen, “o motim teve início após desavenças entre presos, que queimaram colchões para servirem como barreiras. A situação ficou restrita à área dos pavilhões, sendo preservadas as áreas administrativas e portaria.
Não houve reféns e nem internos lesionados”.
Agora, de acordo com a nota, Agepen está fazendo os levantamentos dos danos ao patrimônio. Devido aos danos estruturais causados, a instituição providenciou a movimentação de 107 presos para outras unidades, como medida de segurança e realização dos reparos necessários.
O presídio de Cassilândia foi construído para abrigar 80 internos, mas nesta quarta-feira estava com cerca de 220 detentos. A Agepen não divulgou as cidades para onde foram levados os 107 transferidos ou se fazem parte do PCC. As visitas de familiares, previstas para domingo, estão suspensas.
Operação Sequaz
No começo da manhã desta quarta-feira a Polícia Federal deflagrou a Operação Sequaz e prendeu nove integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) que planejavam assassinar e sequestrar autoridades em São Paulo, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Paraná e Distrito Federal. O senador Sérgio Moro (União-PR), ex-ministro da Justiça no governo Bolsonaro, era um dos alvos da facção. Os criminosos se referiam ao ex-juiz pelo codinome “Tóquio”.
Os atentados contra autoridades tinham também como alvo o promotor Lincoln Gakiya – que investiga o grupo criminoso há cerca de 20 anos -, além de agentes penitenciários e policiais de Mato Grosso e de Rondônia. A facção estabeleceu como Plano A – o objetivo principal dos bandidos – o resgate de Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder do grupo.
A ordem para a operação da PF partiu da juíza Gabriela Hardt, que foi substituta de Moro na 13.ª Vara Federal Criminal de Curitiba na Operação Lava Jato. Em pronunciamento na tribuna do Senado, Moro disse que a classe política e os órgãos de investigação não podem se “render” ou “retroceder” a ameaças e devem adotar “políticas rigorosas” de combate às facções.
Moro soube em janeiro que era um dos alvos do PCC. Isso aconteceu quando Gakiya e o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Luiz Sarrubbo, levaram a Brasília as informações de uma testemunha protegida ouvida pelo Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado (Gaeco): o senador, sua mulher, a deputada federal Rosângela Moro (União-SP), e os dois filhos do casal estavam sendo seguidos pela “Sintonia Restrita”, o setor de operações especiais do PCC.
Monitoramento
Os criminosos comandados por Janeferson Aparecido Mariano, conhecido como Nefo ou NF, receberam há seis meses a ordem para monitorar o alvo. Alugaram chácaras na região de Curitiba. Segundo o ministro da Justiça, Flávio Dino, em uma das chácaras “havia compartimentos sendo preparados em casas. “Compartimentos falsos, paredes falsas. E eles poderiam ser desde para armazenar armamento, droga, como para guardar pessoas.”
Nefo também alugou uma casa perto da residência dos Moro e uma sala comercial ao lado do escritório político do senador, em Curitiba. Os integrantes do PCC fotografaram o cotidiano do casal e dos filhos. Escola, academia, compras e reuniões: tudo foi acompanhado pelos criminosos.
O grupo tinha entre seus integrantes ainda Reginaldo Oliveira de Sousa, o Rê, da “Sintonia Final dos 14” – grupo responsável pelas ordens dirigidas aos membros do PCC que estão em liberdade Eles teriam providenciado carros blindados para a ação.
Investigadores desconfiam que toda a vigilância sobre a família Moro tinha como provável objetivo o sequestro do senador, da deputada e dos filhos, que seriam mantidos reféns em uma das chácaras, para obrigar o Estado a negociar a libertação de Marcola. Não descartam, entretanto, a possibilidade de a facção planejasse matar Moro.
Honra
“O resgate de Marcola é questão de honra para o PCC. Dinheiro tem de sobra”, disse o promotor Gakiya ao Estadão. O ataque às autoridades era o chamado Plano B da facção. Ele estava pronto para ser executado quando o promotor e Sarrubbo chegaram a Brasília. Além de informar a cúpula da PF sobre o caso, os dois também avisaram a Polícia Legislativa. Foi quando Moro e sua mulher souberam que eram o alvo e passaram a ser escoltados.
“Nós acreditamos que ele (o plano) só não foi posto em prática porque faltou a ordem do Marcola”, afirmou o promotor. Após o alerta dado pelo promotor, a PF passou a monitorar telefones e obteve quebras de sigilo para localizar os envolvidos. Antes, há dois meses, um dos principais implicados na ação foi detido em São Paulo pelas Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota). Era Valter Lima Nascimento, o Guinho, outra liderança da Sintonia Restrita.
É Gakiya quem explica o que é a tal sintonia: “Eles são responsáveis apenas por assassinatos e resgates. Não se envolvem em outras atividades, exceto o tráfico de drogas.” Nefo e Ré foram presos ontem pela PF. O primeiro estava na região de Campinas, no interior, e o segundo, na Baixada Santista. Em nome de laranjas e familiares, Nefo teria um patrimônio que incluiria lancha, carros importados e imóveis. “Coisa de milhões.”
Há mais de um ano, a inteligência do Departamento Penitenciário Federal e a PF acompanhavam as movimentações de Marcola e de outros presos da facção na penitenciária federal de Brasília. O resgate envolvia o treinamento de mercenários na Bolívia e a ação de integrantes do Novo Cangaço.
Em razão da descoberta do plano, Marcola foi transferido em março de 2022 para o presídio federal de Rondônia, onde a organização criminosa traçou um novo planejamento para a fuga de seu chefe. Ao mesmo tempo, resolveu cobrar seus integrantes pelo fracasso da operação.
Marcos Roberto de Almeida, o Tuta, que tinha recebido a missão de libertar o chefe, foi sequestrado na Bolívia, em maio de 2022, e levado a um tribunal do crime. Desde então, está desaparecido.
A responsabilidade para soltar Marcola passara, então, para Guinho e, depois, para Nefo. Marcola ficou em Rondônia até janeiro deste ano, quando foi levado de volta a Brasília, após a conclusão da construção de uma muralha no presídio. Foi só então que a facção teria começado a discutir a execução do plano B. Mas era tarde. A ideia de apanhar Moro já havia chegado ao Ministério Público. Ontem, 120 agentes foram às ruas e vasculharam 24 endereços ligados aos investigados. Pelo Menos um destes endereços foi em Campo Grande.
FONTE: CORREIO DO ESTADO