Cinco partidos de centro e de direita criaram formalmente na Câmara dos Deputados um bloco que reúne 142 dos 513 deputados, num racha do centrão que esvazia o poder do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).
Até então integrante do trio que formava o centrão ao lado do PL de Jair Bolsonaro e do PP de Lira, o Republicanos aderiu agora a MDB, PSD, Podemos e PSC, formando a maior força política da Casa -MDB e PSD integram a base de apoio de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e, juntos, ocupam seis ministérios.
A movimentação tem reflexos não só no dia a dia das votações no Congresso, como também na montagem da base de Lula e na sucessão de Lira em fevereiro de 2025.
De acordo com parlamentares ouvidos pela Folha de S.Paulo, o governo, que tem trabalhado até agora em alinhamento com o presidente da Câmara, não influenciou na montagem do bloco.
Após a formalização da união, líderes de Republicanos, MDB, PSD e Podemos se encontraram com o presidente da Câmara nesta quarta-feira (29) para sinalizar que não há intenção de afronta.
Lira postou uma foto em suas redes sociais parabenizando os partidos e afirmando que sempre defendeu a redução dos partidos, “fortalecendo-os e dando à sociedade confiança no nosso sistema partidário”.
A união do Republicanos aos governistas PSD e MDB teve como objetivo formal fazer frente às articulações de Lira para formar uma federação entre PP e União Brasil, o que acabou não ocorrendo. Os dois partidos, porém, podem ainda formar um bloco.
PP e União Brasil, porém, somariam 108 deputados, ficando atrás dos 142 do novo bloco capitaneado por MDB, PSD e Republicanos.
A criação dessa nova força política na Câmara não significa que Lira deixa de ser peça fundamental no Congresso. Na cadeira da presidência, ele tem o poder de pautar matérias e influenciar na distribuição de verbas do Orçamento, tendo ascendência inclusive sobre parlamentares do bloco recém-formado.
Além do simbolismo político de reunir o maior contingente de cadeiras, a união dá poder ao bloco na composição das comissões mistas (entre Câmara e Senado) que devem ser retomadas para a análise das medidas provisórias, na Comissão de Orçamento e no dia a dia das votações em plenário.
Alguns integrantes do novo bloco afirmam que a união pode ser um estímulo para adesão futura de parte do Republicanos a Lula, embora dois componentes conspirem contra: 1) a avaliação consensual de que nenhum partido de centro e de direita deve dar apoio fechado ao governo e 2) o fato de o partido abrigar o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, um dos nomes cotados para a disputa presidencial de 2026.
Outra implicação da formação do bloco, essa a longo prazo, diz respeito à sucessão de Lira no comando da Câmara.
O líder da União Brasil, deputado Elmar Nascimento (BA), é considerado por vários parlamentares como o candidato de Lira à sua sucessão.
Com o novo bloco, ganham força outros nomes do campo do centro e da direita, como o presidente do Republicanos e vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira (SP), e o líder do MDB, Isnaldo Bulhões Jr. (AL).
Embora dois anos seja tempo mais do que suficiente para bruscas mudanças na política, se a eleição para o comando da Câmara fosse hoje, Elmar teria um apoio potencial de cerca de 200 deputados -a soma de PP, União Brasil e o oposicionista PL– contra 142 do candidato do novo bloco.
Os cerca de 120 votos do PT e demais partidos de esquerda, nesse caso, seriam decisivos para um dos dois lados.
O movimento que esvazia o poder interno de Lira ocorre ao mesmo tempo em que o presidente da Câmara trava uma disputa com o Senado em torno da tramitação das MPs, que são o principal mecanismo do governo para legislar -mas que precisam ser validados pelo Congresso.
O deputado defende um modelo que mantenha em suas mãos o poder sobre a tramitação dessas medidas, mas o Senado quer retomar o que está previsto na Constituição: a formação inicial de comissões compostas meio a meio por deputados e senadores.
Lira já cedeu em seu pleito inicial, propondo que essas comissões tenham três deputados para cada senador, mas essa proposta de proporcionalidade deve ser recusada pelos senadores.
O imbróglio persiste, com potencial de estrago para os interesses do governo. Alguns aliados de Lira dizem reservadamente que o presidente da Casa forçou a mão nesse episódio e que agora será obrigado a ceder.
Tendo sido eleito com uma base de partidos de esquerda que ocupam apenas um quarto das cadeiras da Câmara, o presidente Lula buscou em um primeiro momento atrair para a base do governo PSD, MDB e União Brasil, distribuindo três ministérios para cada uma dessas legendas de centro e de direita.
Fruto da fusão do DEM (ex-PFL, partido arquirrival do PT) e PSL, partido que elegeu Bolsonaro, a União Brasil projeta-se como a sigla com potencial de ter o maior número de dissidentes contra o Planalto.
Na votação de quarta-feira (29), por exemplo, a sessão da Câmara foi derrubada a pedido da própria liderança do governo por receio de derrota, já que Elmar Nascimento, o líder da bancada da União Brasil, havia orientado os deputados a entrar em obstrução.
Mesmo que haja uma adesão majoritária de PSD, MDB e União, o governo terá uma base que não é considerada folgada –para isso, precisaria de um apoio que superasse com relativo conforto o mínimo necessário para aprovação de emendas à constituição, que são 308 das 513 cadeiras. Por isso, Lula busca também a adesão de dissidentes do centrão.
FONTE: CORREIO DO ESTADO