Apesar de a Resolução nº 305, de 17 de dezembro de 2019, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), regulamentar a participação de magistrados em redes sociais no Brasil, somente nos três primeiros meses deste ano, o Conselho já teve de suspender as redes sociais do juiz Luís Carlos Honório de Valois Coêlho, da Vara de Execuções Penais de Manaus (AM), no dia 19 de janeiro, por posts contra o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Além disso, determinou a instauração de reclamação disciplinar para que seja analisada a conduta do magistrado por publicações de cunho político-partidário nas suas mídias sociais.

O CNJ também afastou a juíza Ludmila Lins Grilo, da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Unaí (MG), no dia 15 de fevereiro, por ter feito postagens nas redes sociais com ataques ao Judiciário.

E, na terça-feira (28), iniciou-se o julgamento do processo administrativo disciplinar contra o juiz federal Antonio Cláudio Macedo da Silva, vinculado ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), por supostamente publicar nas redes sociais postagens com juízo depreciativo sobre membros do Poder Judiciário, incluindo o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Segundo informou ao Correio do Estado o representante institucional do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no CNJ, Mansour Elias Karmouche, que é ex-presidente da Ordem em Mato Grosso do Sul, o corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, está sendo muito rigoroso sobre esse tema, pois o magistrado é uma referência na sociedade e, a partir de suas manifestações, as pessoas tendem a seguir um mesmo posicionamento.

“A Lei Orgânica da Magistratura Nacional [Loman] veda a participação de magistrados em política partidária, bem como o CNJ já regulamentou a participação de magistrados em redes sociais, razão pela qual a contenção e a circunspecção são necessárias para manter a independência e a imparcialidade do magistrado em toda e qualquer situação, pois representa o Estado-Juiz e deve levar à sociedade sobriedade, serenidade, paz e equilíbrio para dizer o direito de forma igualitária a todo e qualquer cidadão”, pontuou Mansour Karmouche.

MAGISTRADOS

Sobre essa questão do mau uso das redes sociais por parte de alguns magistrados, o presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), desembargador Sérgio Fernandes Martins, disse ao Correio do Estado que esse assunto já tem uma regulamentação e, portanto, os juízes e desembargadores devem segui-la.

“Existem os preceitos da Lei Orgânica da Magistratura Nacional e do Código de Ética da Magistratura Nacional, além da Resolução nº 305, de 17 de dezembro de 2019, do CNJ, que estabelecem vários parâmetros para o uso das redes sociais pelos membros do Poder Judiciário de modo a compatibilizar o exercício da liberdade de expressão com os deveres inerentes ao cargo”, completou o desembargador Sérgio Fernandes Martins.

O presidente do TJMS acrescentou que, sem juízo de valores sobre qualquer fato em questão, “os magistrados têm de ficar atentos ao que postam nas suas redes sociais”.

A presidente da Associação dos Magistrados de Mato Grosso do Sul (Amamsul), Mariel Cavalin dos Santos, também reforçou que a atuação de juízes nas mídias sociais é regulada pelo CNJ, cabendo ao Conselho zelar pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, ou seja, a postura ética do magistrado para com seus colegas e magistrados, bem como zelar pela observância dos princípios da legalidade e da moralidade.

“Essa resolução tem como objetivo compatibilizar dois princípios fundamentais: o interesse público e a liberdade de expressão. Como a magistratura é uma carreira pública, representativa de um dos poderes políticos do Estado, voltada a entregar à Justiça no caso concreto, exigindo do seu integrante uma postura imparcial e neutra, equidistante das partes, bem como uma postura íntegra no sentido ético-moral, acaba o juiz não tendo a mesma dimensão de liberdade que é conferida, em via de regra, ao cidadão para expressar suas opiniões e pensamentos, sendo, portanto, esses direitos, em certo grau, restringidos em função da atividade pública que exerce”, analisou Mariel Cavalin.

DECORO

Segundo a presidente da Amamsul, a Resolução nº 305, de 17 de dezembro de 2019, foi inspirada nos princípios de Bangalore (Índia), elaborados pelo Grupo de Integridade Judicial e aprovados com apoio das Nações Unidas, em 2002, que é um Código de Conduta Judicial que se resume em seis diretrizes, as quais muito se assemelham ao Código de Ética da Magistratura, aprovado em 2008, pelo CNJ: independência, imparcialidade, integridade, idoneidade, igualdade e competência e diligência.

“Fundamentada nesses princípios, a resolução do CNJ exige, de maneira geral, do magistrado decoro conduta moderada e respeitosa na forma como for atuar nas redes sociais, sem se autopromover ou se ter uma superexposição, sendo vedada a utilização dos símbolos oficiais para se identificar nas redes sociais. O fato de usar pseudônimos não o isenta de observar os padrões éticos e morais de conduta. Deve evitar manifestações que possam impactar negativamente a magistratura e a instituição, bem como se abster de compartilhar conteúdo ou manifestar adesão a conteúdo, sem ter a certeza sobre a sua veracidade, a fim de não alimentar e propagar fake news”, ressaltou a juíza.

Para Mariel Cavalin, é aconselhável evitar opiniões e aconselhamentos em temas jurídicos que possam ser de sua atribuição ou de outro colega.

“Se for emitir opiniões desse tipo, só em obras técnicas e em exercício do magistério. Não pode praticar nenhuma forma de discriminação ou preconceito. Não pode emitir opinião político-partidária ou desabonar ou fazer crítica a candidatos, lideranças políticas e partidos políticos. É vedado emitir opinião sobre processo em curso ou fazer juízo depreciativo acerca de pronunciamento tomado por outro colega. Não pode associar sua imagem à marca de empresas e a produtos e serviços comerciais”, enumerou.

A presidente da Amamsul argumentou que uma das poucas exceções que estão imunes à resolução do CNJ é o caso dos dirigentes de entidades associativas, guardadas, obviamente, as devidas proporções, ou seja, desde que não cometam excessos.

“Portanto, a resolução deixa bem nítido que a vida pessoal do juiz é indissociável da vida pública e da carreira que exerce, de modo que dele se exige uma postura neutra e uma conduta irrepreensível na forma como atua nas mídias sociais”, finalizou.

Saiba: Conselho afasta juíza que atacou Judiciário – A juíza Ludmila Lins Grilo, da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Unaí, em Minas Gerais, foi afastada por unanimidade pelo CNJ.

O órgão abriu duas investigações contra a magistrada. Uma delas é por ter feito postagens em redes sociais com ataque ao Judiciário que, segundo o CNJ, ferem a Lei da Magistratura.

Em relação às postagens feitas pela juíza contra o CNJ, foram juntadas manifestações públicas da magistrada com frases irônicas e montagens de fotos com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.

 

FONTE: CORREIO DO ESTADO