O fato de mais um deputado estadual de Mato Grosso do Sul, Professor Rinaldo Modesto (Podemos), correr o risco de perder o mandato porque o partido pode ter burlado a Lei Federal nº 9.504/1997, que estabelece que cada legenda deve preencher o porcentual mínimo de 30% de candidaturas femininas entre seus candidatos em eleições proporcionais, causou revolta no professor doutor da Faculdade de Direito (Fadir), da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Sandro de Oliveira.
Ao ser procurado pelo Correio do Estado para comentar a solicitação feita pelo procurador regional eleitoral Pedro Gabriel Siqueira Gonçalves ao Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul (TRE-MS) para que seja reconhecida a prática de fraude na distribuição do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) realizada pelo Podemos aos candidatos e candidatas do partido nas eleições gerais do ano passado, ele lamentou que os partidos ainda tentem burlar as candidaturas femininas.
Doutor em Direito Constitucional, o professor Sandro de Oliveira ressaltou que, mesmo com a legislação eleitoral prevendo a cota de gênero desde 1997, passando a obrigatoriedade em 2009, os partidos políticos e suas coligações insistem em criar subterfúgios para enfraquecer a candidatura de mulheres.
“Quando não criam candidaturas de mulheres fictícias, dificultam o repasse de verba necessária para que a candidata consiga administrar sua campanha. O problema não é novo, se renova a cada período eleitoral”, lamentou-se o doutor em Direito Constitucional.
Ele completou afirmando que parte do problema é a predisposição dos parlamentares federais de buscar anistia, findo o processo eleitoral, para aqueles que violaram as normas eleitorais e as decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
“Vale frisar que esse comportamento fere princípios fundamentais constitucionais da cidadania, dignidade da pessoa humana e da igualdade. Também há violação da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher”, citou Sandro de Oliveira.
Ele se referiu ao artigo 1º, que traz o seguinte: “Para fins da presente convenção, a expressão ‘discriminação contra a mulher’ significará toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo”.
Ainda na mesma convenção, o Artigo 7º trata especificamente da participação da mulher na política: “Artigo 7º – Os Estados partes tomarão todas as medidas apropriadas para eliminar a discriminação contra a mulher na vida política e pública do País e, em particular, garantirão, em igualdade de condições com os homens o direito a:
1 – votar em todas as eleições e referendos públicos e ser elegível para todos os órgãos cujos membros sejam objeto de eleições públicas;
2 – participar na formulação de políticas governamentais e na execução destas, e ocupar cargos públicos e exercer todas as funções públicas em todos os planos governamentais;
3 – participar em organizações e associações não governamentais que se ocupem da vida pública e política do País.”
Para o professor da Faculdade de Direito da UFMS, a Convenção não é mero compromisso internacional assumido pelo Brasil, pelo contrário, faz parte do sistema jurídico brasileiro, na medida que vigora como se fosse desde 2002, quando foi promulgado pelo Decreto nº 4.377/2002.
“Veja que a participação da mulher na política se dá em termos de igualdade de condições com os homens em todos os níveis. Obviamente, também no acesso aos recursos de campanha. Tenho que somente com ação mais enérgica dos órgãos de controle, inclusive com a perda de mandato, os partidos políticos deixarão de ser androcêntricos, ou seja, com o homem como figura central dentro do partido”, finalizou Sandro de Oliveira.
FONTE: CORREIO DO ESTADO