Mato Grosso do Sul vive momento de deflação dos alimentos, contudo, o cenário favorável para o consumidor pode perder força no fim deste semestre. Os efeitos do El Niño e uma possível elevação do preço do diesel podem inflacionar o custo da alimentação.

O fenômeno climático afeta a distribuição das chuvas e, consequentemente, influencia o resultado da produção de alimentos no início da cadeia produtiva. Já na fase de transporte, o frete também pode ficar mais caro, considerando que os preços do óleo diesel acumulam defasagem de 26% ante o mercado internacional.

No panorama atual, o Estado acumula queda em diversos alimentos, conforme indicam dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O grupo alimentação e bebidas registrou leve recuo, de 0,04%, no sétimo mês do ano, e de 0,78% no acumulado de 2023 em Campo Grande. No cenário nacional, alimentos e bebidas acumulam 0,55% no ano e no mês o grupo registrou recuo de 0,46%.

Entre os produtos que podem sofrer de forma mais intensa em virtude da mudança climática estão cereais, leguminosas e oleaginosas, que em julho acumularam deflação de 1,23% em Campo Grande, e ainda tubérculos, raízes e legumes, com retração de 1,41% na comparação com junho.

No ano, tubérculos, raízes e legumes acumularam retração de 11,87% na Capital. Enquanto no âmbito nacional o subgrupo contou com queda de 8,27%.

A supervisora do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos de Mato Grosso do Sul (Dieese-MS), Andreia Ferreira, explica que o El Niño interfere no clima de modo intenso e tende a afetar a agricultura, setor que é muito sensível a tais variações.

“Afeta as culturas, prejudicando tanto a qualidade quanto a oferta dos alimentos. Se a quantidade é afetada pelo excesso, os preços tendem a baixar, se é falta, os preços tendem a subir. Além disso, há outros fatores que interferem no preço dos alimentos e o El Niño é um complicador a mais no processo de precificação dos produtos do campo”, aponta a economista.

Em complemento à possibilidade de aumento dos alimentos, Éder Comunello, pesquisador em Agrometeorologia da Embrapa Agropecuária Oeste, faz apontamentos sobre o dano econômico.

“O El Niño se deve primordialmente à redução potencial da produção, antes do encarecimento dos insumos e práticas agrícolas adotadas. Em qualquer caso, espera-se um incremento no custo de produção por tonelada produzida, refletindo na alimentação”.

Agricultura

Na Região Centro-Oeste, as previsões de impactos referentes ao El Niño ainda são incertas, entretanto, especialistas do Centro de Monitoramento do Clima e do Tempo de Mato Grosso do Sul (Cemtec-MS) apontam que teremos um fenômeno de moderado a forte.

Do ponto de vista da produção de grãos, o responsável pelo setor econômico do Sindicato Rural de Campo Grande, Rochedo e Corguinho (SRCG), Staney Barbosa Melo, vai na contramão dos outros especialistas.

“Acredito que o El Niño trará muito mais benefícios do que malefícios às lavouras do Mato Grosso do Sul. A tendência é de que tenhamos um inverno mais quente por aqui, com maior distribuição de chuvas em todo o Estado, o que é bom para o agronegócio local”.

Éder Comunello afirma que os efeitos na agricultura e na pecuária são particularmente importantes em MS, dada a participação dessas atividades na economia local. “Embora ainda não estejamos oficialmente sob um evento de El Niño, o monitoramento nos indica que ele deve se confirmar já no próximo mês”.

Comunello ainda ressalta que os possíveis impactos negativos que preocupam os agricultores são decorrentes do excesso de chuvas, que pode impedir operações de manejo e tratos culturais, bem como temperaturas excessivamente altas, que podem afetar diretamente a fisiologia e a produção das culturas.

“Mesmo com o aumento dos volumes totais precipitados, ainda há de se preocupar com veranicos em período de El Niño. Isso porque é notável a má distribuição das chuvas nesses períodos, com o agravamento de temperaturas mais elevadas”, frisa o pesquisador.

Já o economista diz que a dinâmica vai depender dos efeitos no resto do mundo. “Com a chegada de ondas de calor na China e em outros países produtores de alimentos no Oriente, certamente haverá uma queda de produtividade nessas regiões, sobretudo em relação ao milho e ao trigo. Assim, podemos dizer que os efeitos do El Niño ainda são incertos, mas o que vale é o saldo final. Se o fenômeno provocar aumento na produção global de grãos, então não veremos uma disparada de preços”, conclui Melo.

Defasagem

Outro reflexo que não demora a chegar aos alimentos é o aumento dos combustíveis derivados do petróleo, uma vez que o óleo diesel é a principal fonte de abastecimento do setor.

Conforme reportagem da Folha de São Paulo, postos de gasolina do País começam a reclamar de dificuldades para encontrar diesel, diante da queda de importações privadas nas últimas semanas.

O problema, segundo o setor, reflete as elevadas defasagens em relação às cotações internacionais, que desestimulam importações privadas do produto.

As empresas que seguem importando já começam a repassar aos consumidores a alta das cotações internacionais sobre os volumes comprados no exterior, mesmo que o valor de venda do diesel não tenha sido alterado pela Petrobras desde maio.

 

FONTE: CORREIO DO ESTADO