O TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região) revogou nesta quinta-feira (9) a última ordem de prisão domiciliar em vigor contra o ex-governador Sérgio Cabral. Ele está autorizado a sair de casa, mas permanece usando tornozeleira eletrônica.

A Primeira Seção Especializada do tribunal decidiu por maioria (4 a 3) que o entendimento adotado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) ao revogar sua prisão preventiva em dezembro se encaixa às demais medidas cautelares impostas a Cabral em outros processos.

Cabral poderá sair do prédio em que vive, em Copacabana (zona sul do Rio de Janeiro), mas terá de continuar usando tornozeleira eletrônica. Ele também está impedido de sair do país e deve comparecer mensalmente à Justiça Federal.

Por determinação da Justiça Federal de Curitiba, o ex-governador também está impedido de sair de casa durante a noite e aos fins de semana ou feriados, bem como de realizar festas em casa.

Os magistrados já haviam revogado na semana passada, por interpretação semelhante, a prisão domiciliar estabelecida na Operação Eficiência, que investigou a propina de Cabral depositada em contas no exterior. Nesta quinta, eles tomaram a mesma decisão em relação à Operação Calicute, a primeira investigação que levou à prisão do ex-governador em novembro de 2016.

A juíza federal Simone Schreiber afirmou que o STF “deixou bem claro nos votos que a prisão preventiva era excessiva dado o tempo decorrido”. O juiz Willian Douglas argumentou que as decisões no Judiciário “não podem ser díspares”.

O juiz Marcelo Granado, relator do processo, defendeu o indeferimento do pedido da defesa de Cabral. Ele afirmou que a prisão domiciliar recém-adotada foi um afrouxamento suficiente e que sua revogação pode provocar um sentimento de indignação.

O juiz Flávio Lucas também votou pela manutenção da prisão domiciliar sob argumento semelhante.
“Poucos casos poderiam se destacar com tanta clarividência como este na manutenção da ordem pública. O sentimento que passa é que nada aconteceu.

Se uma soltura acontece e, daqui a três anos, se julga isso e, por ele estar solto, não pode voltar a prisão, fica um vazio. Uma resposta estatal sem qualquer significado.”
Schreiber afirmou que o clamor popular não deve pautar as decisões na Justiça. “A população deve ter compreensão sobre como funciona a Justiça num Estado democrático de Direito. Não acho que o clamor público deva ser um fator determinante na análise. Voto pelo deferimento, pronta para eventuais críticas da opinião pública.”

Granado, após a votação, respondeu ao comentário da colega com leve ironia. “O brasileiro já sabe como funciona a Justiça brasileira. Ele talvez esteja reaprendendo. Ele imaginou que tivesse mudado por um tempo, mas está reaprendendo.”

O juiz Ivan Athié, que votou pela revogação da medida cautelar, afirmou que, na prática, Cabral se manterá numa prisão domiciliar.

“Ele vai continuar em prisão domiciliar porque passará sob escrutínio. Temos visto manifestações que impedem homens públicos de andar pela rua, até no exterior.

O Cabral desagradou grande parte da população e sabe Deus o que poderá ocorrer. Mas está longe de desestabilizar a ordem pública”, disse Athié.

Em nota, os advogados Patrícia Proetti, Thayná Duarte, Daniel Bialski e Bruno Borragine, que representam o ex-governador, comemoraram a decisão. “A defesa celebra o reconhecimento pela Justiça da ausência de motivos e do extenso e absurdo lapso temporal da prisão do ex-governador.”

O ex-governador do Rio de Janeiro pelo MDB ficou seis anos preso sob acusação de comandar um esquema de propina durante seu mandato (2007-2014). Ele foi solto em dezembro após decisão do STF, tendo sido o último preso em regime fechado da Operação Lava Jato.

Nos seis anos de prisão, o ex-governador chegou a acumular cinco mandados de prisão, 37 ações penais (sendo duas sem relação com a Lava Jato) e 24 condenações a penas que, somadas, ultrapassaram 400 anos de prisão.

Cabral é acusado de cobrar 5% de propina nos grandes contratos de seu mandato pelo MDB (2007-2014). As investigações descobriram contas com cerca de R$ 300 milhões no exterior em nome de laranjas, além de joias e pedras preciosas usadas, segundo o Ministério Público Federal, para lavagem de dinheiro.

Inicialmente, o político negava as acusações, mas dois anos depois da prisão decidiu confessar seus crimes. Em 2019, ele conseguiu fechar um acordo de delação premiada com a Polícia Federal, anulado pelo STF em maio de 2021. Nos últimos depoimentos à Justiça e em inquéritos, ficou em silêncio.

 

FONTE: CORREIO DO ESTADO