O setor agropecuário tem encontrado dificuldades para contratar mão de obra, tendo como uma das justificativas mudanças na estrutura social.
Análise da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul) por meio do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-MS) indica que a carência de mão de obra no setor agropecuário no Estado é apontada como um desafio, especialmente em um contexto de mercado de trabalho mais aquecido.
“Dentre os fatores que podem contribuir para esse cenário, podemos mencionar a questão da qualificação profissional, as condições de trabalho, o crescimento econômico e a diversificação, a migração para áreas urbanas e o envelhecimento da população rural”, avalia o analista de economia do Senar-MS, Jean Américo.
O economista explica que as empresas agrícolas frequentemente demandam habilidades técnicas específicas relacionadas ao manejo agrícola, operação de maquinário avançado e técnicas de agricultura de precisão.
“A falta de trabalhadores com essas qualificações pode dificultar o preenchimento de vagas, principalmente em áreas mais tecnológicas e especializadas do setor. Por outro lado, as condições de trabalho no campo podem ser vistas como desafiadoras, incluindo jornadas de trabalho físico sob condições climáticas adversas. Esses fatores podem desencorajar a entrada de novos trabalhadores no setor”, detalha Américo.
Para o analista do Senar-MS, à medida que Mato Grosso do Sul se desenvolve economicamente, outros setores podem oferecer empregos mais atrativos em termos de salário e condições de trabalho, competindo com a agropecuária pela mão de obra disponível.
Ele afirma que há uma tendência contínua de migração da população rural para áreas urbanas em busca de melhores oportunidades de educação e emprego.
“Isso reduz a disponibilidade de mão de obra em regiões predominantemente agrícolas”, relata o economista, que ainda indica o envelhecimento dos trabalhadores rurais e a falta de interesse das gerações mais jovens em seguir carreiras na agropecuária como fatores que contribuem para a escassez de mão de obra no Estado.
O mestre em Economia Lucas Mikael acrescenta que a falta de trabalhadores no setor agropecuário de Mato Grosso do Sul pode ser atribuída a uma combinação de vários fatores como a modernização avançada no segmento, o que exige habilidades técnicas e conhecimento especializado.
“A falta de programas de educação e treinamento voltados especificamente para as necessidades do setor agropecuário pode resultar em uma lacuna de trabalhadores qualificados”, afirma Mikael.
Confirmando o cenário de insuficiência para o Estado, dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostram que o estoque de emprego formal em MS apresentou expansão em maio deste ano. Contudo, o setor agropecuário registrou movimento contrário, com saldo negativo de 464 postos de trabalho no mês.
IMPACTO
Na análise do doutor em Administração Leandro Tortosa, a escassez de trabalhadores no campo pode trazer efeitos negativos para Mato Grosso do Sul. “Pode impactar na redução da produção agrícola, com menos mão de obra. Então, pode resultar em uma produção e uma produtividade menor”, salienta.
Um aumento nos custos da produção também é indicado como fator pelos analistas consultados pelo Correio do Estado, tendo em vista que, com a escassez de mão de obra, os empregadores terão que oferecer salários mais altos para atrair mais trabalhadores.
Em um segundo momento, eles teriam que mecanizar a agricultura se fosse o caso, e isso demandaria investimentos, o que seria um custo alto de início. E ainda haveria um impacto na exportação, uma vez que Mato Grosso do Sul é um grande exportador de commodities agrícolas.
Mikael reforça que um dos resultados possíveis para a falta de trabalhadores é a limitação da capacidade dos produtores de plantar, cultivar e colher safras agrícolas, assim como cuidar do gado e de outras atividades pecuárias.
“Isso pode resultar em uma diminuição na produção de alimentos e produtos agropecuários, afetando a oferta disponível no mercado”, analisa.
RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Mesmo sendo um dos pilares econômicos do Estado, o agronegócio local enfrentou um aumento significativo nos pedidos de recuperação judicial no ano passado.
De acordo com os últimos dados divulgados pela Serasa Experian, em 2023, 10 produtores que operam como pessoa física no Estado recorreram à Justiça para evitar falência.
Os números revelam que, ao longo de um ano, os pedidos aumentaram consideravelmente, passando de nenhum em 2022 para 10 em 2023. Em contraste, apenas um empresário havia solicitado recuperação judicial em 2021.
Como divulgado em março deste ano pelo Correio do Estado, Marcelo Pimenta, head de Agronegócio da Serasa Experian, destacou que o aumento do número de pedidos de recuperação judicial era esperado, citando fatores como condições climáticas adversas que têm impactado a produção agrícola e as dificuldades econômicas, tanto no cenário nacional quanto no internacional.
A conjuntura de taxas de juros elevadas no Brasil também contribuiu para a limitação e o encarecimento do crédito rural, o que afetou diretamente a capacidade dos produtores rurais de utilizar os recursos financeiros necessários para cumprir seus compromissos mais urgentes.
“Os dados refletem a realidade difícil enfrentada pelo setor agrícola. Apesar de muitos produtores conseguirem administrar seus investimentos futuros e gerenciar suas despesas operacionais com estratégia, os números mostram um aumento contínuo no número de produtores à beira da insolvência”, avalia o economista do Sindicato Rural de Campo Grande, Rochedo e Corguinho (SRCG), Staney Barbosa Melo.
Para mitigar essa situação, Melo destaca a importância de considerar a continuidade e a escalonamento como indicadores sistêmicos na análise de crédito pelos bancos credores. “Isso poderia facilitar a vida dos produtores rurais, pois o aumento constante nos pedidos de recuperação judicial aponta para dificuldades profundas dentro do setor”, destaca.
FONTE: CORREIO DO ESTADO