Estimativa da Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano de Campo Grande (Planurb) indica que, daqui a 10 anos, em 2034, a Capital deverá chegar a marca de 1 milhão de habitantes. Para reduzir os impactos que isso poderá causar na mobilidade urbana da cidade, o arquiteto e urbanista Ângelo Arruda propõe que cada bairro tenha seus respectivos planos diretores, dando condições para que os moradores trabalhem na região em que residem.
Segundo o professor doutor, que presidiu a Federação Nacional dos Arquitetos, a estruturação dos bairros e a descentralização das ofertas de trabalho é uma das medidas para contribuir para uma melhora da mobilidade urbana da Capital.
“Vamos instrumentalizar as unidades regionais, criando os planos diretores regionais, criando os planos diretores de bairro, ocupando a cidade da periferia para o Centro. Eu preciso fazer com que a população do Tiradentes fique no Tiradentes, trabalhe no Tiradentes, ocupe o Tiradentes, por exemplo. Vamos fazer um planejamento urbano no Tiradentes para [o residente de lá] não ter que sair de carro para ir a outro lugar da cidade, piorando a condição de mobilidade urbana de Campo Grande”, propõe o arquiteto.
O Bairro Tiradentes, citado por Arruda como exemplo, foi um dos que mais cresceu nos últimos anos e que se tornou um dos mais populosos da Capital, assim como o Nova Lima, que agora é o bairro com a maior concentração populacional da cidade, com 41.131 pessoas, segundo dados do Censo Demográfico 2022 interpretado pela Planurb.
“As Moreninhas estão do jeito que estão [em relação à população], e o Aero Rancho também está do jeito que está, mas novos espaços urbanos surgiram. E com isso, eu preciso ter os espaços planejados dentro desse bairro. Fazer ruas de pedestres nos bairros, fazer espaços de lazer dentro dos bairros o máximo possível, para que a gente não incorpore a população circulante dentro da cidade”, afirma Arruda.
“Se a cidade tem 1 milhão de habitantes e tem a área que Campo Grande tem, a gente não pode administrar [o município] sentado na [Avenida] Afonso Pena. A gente tem que administrar ela descentralizadamente”, avalia.
MOBILIDADE
Reflexo de uma grande população, a mobilidade urbana é um dos principais problemas a serem enfrentados a partir do momento em que uma cidade cresce. Para tentar resolver essa questão, o arquiteto e urbanista sugere uma revisão na forma atual de transporte público de Campo Grande.
Segundo Arruda, daqui a 10 anos será necessário que a cidade tenha outra modalidade de transporte, como BRT – sigla em inglês para bus rapid transit ou transporte rápido de ônibus em tradução livre – e metrô.
“Daqui a exatamente 10 anos, em agosto de 2034, o IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] vai dizer que Campo Grande chegou a [marca de] 1 milhão de habitantes. E ao fazer isso, a gente vai participar de um grupo seleto hoje de 17 cidades – e que possivelmente vai ser de 20 cidades em 2034 – com 1 milhão de habitantes”, diz Arruda.
E aí que começam a morar as novas tendências de uma cidade de futuro, porque você entra no clube do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], você entra no clube especial do BID [Banco Interamericano de Desenvolvimento], você entra no clube especial dos fundos de desenvolvimento”, opina.
“Não há mais justificativa para dizer que não cabe BRT em Campo Grande, não há mais justificativa para dizer que não pode ter metrô de superfície em Campo Grande, que era a justificativa que dávamos há 25, há 30 anos, quando nós tínhamos 500 e poucos habitantes”, complementa.
A diversificação de oferta de transporte coletivo é uma necessidade, visto que Campo Grande tem uma das maiores quantidades de veículos por habitantes do Brasil. Conforme dados do Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul (Detran-MS), a Capital tem hoje 665.512 veículos, o que significa quase um veículo por habitante – dos 898.100 campo-grandenses, segundo o último Censo.
“A cidade é uma cidade que tem renda. As pessoas são ricas do ponto de vista material e são donas de três, quatro, cinco veículos por unidade habitacional. E todo mundo quer sair [de carro] para ir da sua casa para o trabalho, para ir no shopping,
para ir no cinema. Ninguém faz isso no lugar onde mora. Então, vamos fazer isso no lugar onde a gente mora. Precisamos ser eficientes na gestão”, analisa o arquiteto e urbanista.
VERTICALIZAÇÃO
Outra questão que acompanha o desenvolvimento de uma cidade é a verticalização, ou seja, a oferta cada vez maior de prédios tanto para moradia quanto para novos empreendimentos.
Para Arruda, esse não é um problema, e sim uma causa natural do desenvolvimento chegando. “Tem colegas aqui na cidade dizendo que isso [o aumento de carros] é culpa da verticalização. Estão mentindo, tem menos de mil edifícios em Campo Grande. A verticalização não é responsável pela quantidade de veículos circulando hoje na cidade, que beira a um número muito alto entre as 10 cidades brasileiras com a maior quantidade de veículos por habitante. O que é isso? Renda”, finaliza.
Adensamento traz economia para a cidade
Promover o adensamento populacional em áreas com maior disponibilidade de infraestrutura é um dos principais objetivos do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental de Campo Grande. A medida, conforme a diretora-presidente da Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano da Capital (Planurb), Berenice Maria Jacob Domingues, visa melhorar a qualidade de vida da população, enquanto facilita o acesso a serviços básicos.
Para falar sobre essa importante ferramenta que está em vigor há cinco anos e que tem como objetivo guiar o crescimento de forma ordenada da cidade, delimitando perímetros para garantir um desenvolvimento igualitário, Berenice foi convidada pelo Correio do Estado para participar do debate de ideias Campo Grande que Queremos.
“Esse [atual] Plano Diretor, aprovado no dia 4 de dezembro de 2018 e que só entrou em vigor em 2 de agosto de 2019 – portanto, nós acabamos de fazer cinco anos de vigência dele –, apresenta diretrizes de políticas setoriais, como educação, saúde, segurança, assistência, bem-definidos. Até então nós não tínhamos. Nós trouxemos esses conceitos para dentro do Plano Diretor”, ressaltou a diretora-presidente da Planurb.
A importância do documento para a cidade já foi abordado por diversas matérias do Correio do Estado, principalmente quando emenda da Câmara Municipal, em projeto de lei do Executivo, poderia enterrar o texto.
Segundo Berenice, que ajudou a construir o documento, um dos principais objetivos das normas é promover o desenvolvimento urbano de forma sustentável e benéfica para toda a população.
“O Plano Diretor vem como um instrumento importante de desenvolvimento urbano, para organizar a política básica de desenvolvimento e de expansão urbana, e é parte integrante de um processo permanente de planejamento, trazendo as diretrizes e as estratégias de curto, médio e longo prazos com relação à habitação de interesse social, à regularização fundiária,
à mobilidade, ao urbanismo, ao meio ambiente, ao desenvolvimento econômico, à saúde, à educação e à segurança pública”, declarou Berenice.
“O foco é o adensamento em áreas com maior disponibilidade de infraestrutura. Isso é importantíssimo para a cidade
e isso traz uma economia para a cidade. E por outro lado, a possibilidade de o cidadão morar e ter melhor qualidade de vida, porque ele já tem toda a infraestrutura disponível no momento em que ele vai utilizar aquela moradia ou aquele comércio”, continuou.
Especialista em Gestão e Direito Ambiental e pós-graduada em Gerência de Cidades, a diretora-presidente da Planurb esclareceu que o documento é um instrumento em que são discutidas todas as facetas que compõe uma cidade, a fim de tentar buscar um equilíbrio entre o crescimento, o desenvolvimento e a vida em sociedade.
“Aquelas diretrizes previstas no Plano Diretor devem ser observadas e incorporadas a planejamentos estratégicos e de disponibilidade de recursos financeiros e orçamentários. Também abrange a delimitação da área urbana, das zonas urbanas, dos parâmetros urbanísticos e dos usos que devem ser observados na ocupação desse território. E para isso, fazemos várias leituras técnicas para chegarmos nessa tabela de usos e nesse zoneamento”, disse.
“Essa leitura técnica passa pela carta geotécnica, passa pela carta de drenagem, passa pelos indicadores demográficos e sociais de cada bairro da cidade, passa por uma leitura comunitária, que é a oportunidade que a gente tem de se materializar a gestão democrática, a gestão participativa no município, em que a gente busca conversar com a sociedade e trazer essa leitura comunitária para se juntar à leitura técnica, e aí a gente ter o resultado desses parâmetros, das prioridades, da transversalidade de temas”, complementou Berenice.
Todas essas especificações, ainda segundo a diretora-presidente da Planurb, servem para nortear o crescimento e o desenvolvimento ordenado da cidade e garantir que esses processos resultem em um desenvolvimento sustentável “que passa pelo desafio de utilizarmos o território urbano”.
CRESCIMENTO
A geração de recursos para a prefeitura também é um tema importante para o Plano Diretor, uma vez que é preciso equilibrar a necessidade de captação de novos empreendimentos com o crescimento ordenado.
“Também buscamos a racionalização do custo para se manter uma cidade. Esse também é um assunto que discutimos no Plano Diretor”, frisou Berenice.
“E todos esses fatores devem estar alinhados para um desenvolvimento econômico sustentável também, porque nós sabemos que esse desenvolvimento econômico é o sustentáculo da cidade. Como é que uma cidade se mantém? Ela precisa de bons investimentos e de boas arrecadações para que o poder público cumpra a sua função, que é prestar os serviços
à sociedade da melhor maneira possível”, finalizou a diretora-presidente da Planurb.